Mutantes e Seus Cometas no País do Baurets.

Capítulo XIV
Mutações.
– Ô ôouhh! Acho que estamos encrencados... – Arnolpho Lima havia dito.
E era verdade: aqueles dois furiosos cães, estavam prestes a estraçalhar as carnes de nossos pobres aventureiros; rosnavam circulando em torno de nossos amigos, com os afiados e pontiagudos dentes a mostras; os pelos eriçados, prestes a darem o bote.
– Oh, o que faremos agora? – indagou Arnolpho.
– Ah, como eu gostaria de poder pular para longe daqui – foi a única coisa que Baptista pode dizer.
– Bem que eu gostaria de ter asas, isso sim, para poder voar para bem distante... – disse Sérgio Dias.
– E como eu desejaria ter uma grande boca de crocodilo, cheia de dentes afiados. Ai sim, estes vira-latas iam ver o que é uma grande e forte mandíbula – Arnolpho fantasiou.
– Tenham calma! – Rita respondeu a eles – Vejamos do que é capaz este pó de pirlimpimpim... – Assim falou, e assim abriu sua bolsa, apanhando um punhado do pó de pirlimpimpim. Espalhou um pouco do pó mágico sobre a cabeça de cada um de seus amigos, e a metamorfose não tardou: como que satisfazendo o desejo de cada um, logo, começou a se abrir um par de asas nas costas de Sérgio Dias, eram asas como as de um inseto, e logo abaixo de seus braços, começaram crescer dois pares de pernas de inseto. Enquanto isso, Arnaldo Baptista via suas pernas se transformarem em fortes pernas de grilo, tendo um outro par de pernas menores nascendo, também abaixo de seus braços, nas costas pequenas asas de grilo nasceram, protegidas por uma carapaça. Com Arnolpho a metamorfose também ocorria, e como ele havia desejado anteriormente, via agora, sua boca transformar-se em uma grande e poderosa mandíbula de crocodilo, e via também, uma enorme e potente calda crescer-lhe.
Enquanto estes sortilégios ocorriam Rita tratou de espalhar o pó de pirlimpimpim, também sobre sua cabeça, e logo viu um lindo par de alvas asas abrirem-se em suas costas, eram como as brancas plumas de um cisne, de um branco imaculado.
Os dois ferozes cães vigias, observavam a tudo aquilo, abismados e surpresos.
E quem mais se divertia com aqueles prodígios, parecia ser Arnolpho.
– Veja que beleza! – dizia ele, sacudindo a calda com violência, fazendo ela ricochetear.
– Vamos embora, não percamos tempo! – Rita falou a todos. – Deixemos estes dois para trás.
– Vão vocês... – Arnolpho respondeu, empolgado. – Eu tenho que acertar umas coisinhas com estes dois cães sarnentos!
– Tem certeza? Venha conosco... – Baptista insistiu. – Deixe estes dois de lado.
– Não, podem ir. Agora vou dar uma lição nestes pulguentos...
– Bem, se é isso que você quer... – foi Sérgio quem falou desta vez. – Acho melhor irmos então... O que acham? – ele perguntou aos outros dois.
– Sim, acho que devemos ir... – Rita respondeu, um pouco triste, e falou depois a Arnolpho: – Até mais amigo, se cuide.
– Até mais minha querida amiga. Nunca irei esquecer o que você fez por mim, você estará sempre em meu coração. – Arnolpho falava com ela, enquanto ameaçava uma rabada nos cães, mantendo eles afastados. – E obrigado a vocês dois também, grandes amigos, podem contar comigo para o que der e vier.
– “Adeus amigo Arnolpho”! – responderam os três ao mesmo tempo.
Feitas as despedidas, Baptista foi o primeiro a testar sua nova forma: virou seu corpo na direção que rumavam anteriormente, soltou um “cricri” característico aos grilos, e disparou sua potente perna, lançando-se aos ares em um gigantesco salto. Logo depois, foi Sérgio que pôs suas asas em movimento; imediatamente, um grande zumbido fez-se ouvir, e sem mais demora ele alçou vôo. Rita o seguiu logo atrás: abriu suas grandes e graciosas asas de cisne e ganhou os céus com leveza.
Neste meio tempo, Arnolpho permaneceu divertindo-se com os dois valentes cães, que ainda o enfrentavam, mesmo após sua metamorfose. O grande cão, tentava avançar em um bote sobre Arnolpho mas ele se defendia tentando abocanhá-lo com suas mandíbulas de crocodilo, ou com a calda, ricocheteando-a no ar e lançando o cão longe – que caia levantando poeira e soltando um ganido. Com a fêmea não era diferente, era rabada para cá, mordida para lá; até que depois de mais alguns minutos, os dois cães desistiram do ataque, vendo que era impossível confrontarem-se com Arnolpho-crocodilo.
Já nossos heróis aproveitavam suas novas e mágicas formas: Rita sacudia com leveza, suas grandes asas, brancas como a neve, planava aproveitando uma corrente de ar, fazia parábolas no ar, usando toda envergadura de suas grandes asas. Sérgio voava ligeiro, com suas frenéticas asas de inseto, mergulhava veloz, e voltava a subir, dava giros no ar, mal podendo se conter. Arnaldo Baptista então, parecia ser o que mais se divertia, dando enormes e distantes saltos, lançava gritos de alegria, e vez por outra, ele acompanhava o vôo da Rita e do Sérgio, agitando suas pequenas asas de grilo, podendo assim dar pequenos vôos durantes seus saltos; e ia saltando de um morro para o outro, de uma grande árvore, para um campo... Ia repleto de alegria, e cantava:
“Dizem que sou louco
Por pensar assim
Seu eu sou muito louco
Por eu ser feliz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz
Não é feliz...”
Rita sorria feliz com a cantoria de Baptista e resolveu emendar, também cantando, enquanto batia suas alvas asas, cortando os céus:
“Se eles tem três carros
Eu posso voar
Se eles rezam muito
Eu já estou no céu
Mas louco é quem me diz
E não é feliz
Não é feliz...”
Sérgio Dias, também não ficou para trás, cantou também a sua parte, em meio aos zumbidos de suas asas:
Sim, sou muito louco
Não vou me curar
Já não sou o único
Que encontrou a paz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz
Não é feliz...”
Assim que Baptista tornou a alcançar-lhes em um salto, e acompanhá-los com suas asinhas de grilo, entoaram juntos, um refrão:
“Eu juro que é melhor
Não ser um normal
Se eu posso pensar
Que Deus... sou eu...”
Após percorrerem um longo trajeto, cantando felizes, nesta fantástica viagem, Rita quis pousar sobre uma verde colina. Foi acompanhada logo a seguir por Sérgio, que gritou a Baptista que parasse; e assim que os três se encontraram juntos na colina, Rita tratou de dizer a seus amigos:
– Bem meus amigos, nunca me esquecerei destes últimos maravilhosos e encantados dias pelo que passei, nunca fui tão feliz em toda minha vida. Vocês são os melhores amigos que eu poderia desejar ter. Acho que é chegada a hora, no entanto, de retornar para casa; vocês sabem o quanto eu desejo isso. A tarde está chegando a seu fim, logo o sol irá se pôr, gostaria de poder estar em casa antes que anoitecesse.
– Mas querida Rita... – Sérgio argumentou. – Coitado de mim. Eu sem você não sou ninguém!
– És muito bem-vinda entre nós... – ressaltou Baptista. – Garanto que iremos ter, lindos dias pela frente. Eu sem você não sou ninguém...
– Sim, muito me entristece deixar vocês – Rita respondeu. – Hoje é o primeiro dia do resto de minha vida...
– “E da minha também...” – Baptista e Sérgio, disseram em uníssono.
Fez-se o silêncio por alguns segundos. Todos os três estavam de cabeças baixas, pensativos.
– Mas deixemos de tristeza! – disse Rita rompendo aquele silêncio. – Aproveitemos o tempo que ainda nos sobra!
– Pois é como eu ia dizendo – falou Sérgio, – temos que nos cuidar; senão vai ser muito chato ver você do lado de lá
– Frique comigo! – pediu Baptista.
– E comigo... – reiterou Sérgio.
– Não fiquem tristes, eu quero vê-los bem... – Rita lhes falou, alisando a face de um e do outro. – Deixem de ser mal-humorados!
Não havia como não se enternecer com a bela Rita; era apenas olhar em seus doces olhos, ouvir sua voz macia, que qualquer coração se entregaria cativo a ela.
Dessa forma, livres das aflições que carregavam no peito, os três amigos sorriram e se abraçaram apertado; confiantes no que haveria por vir, pois juntos sentiam-se fortes.
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