"Independência ou Morte!".
Forte e gratuito?
Também lembra furto”.
Drummond
Acordei cedo no dia de hoje, para vir trabalhar, já que moro longe. Peguei minhas coisas, minha roupa, minha arma e vim para o banco fazer o meu trabalho. E agora aqui estou eu dentro do banco sempre vigilante, aguardando para agir a qualquer momento. Vejo várias pessoas entrando no banco: executivos, office-boys, senhoras, rapazes e garotas, enfim, gente de toda tipo e de todo nível social. Vez por outra, uma destas pessoa passa e me nota, me observa, e segue em frente.
Mas hoje não estou me sentindo muito bem, estou tenso, minhas mãos estão suando. Não sei dizer bem o porquê, mas estou muito tenso. Sempre fui uma pessoa muito controlada, fria, mas não sei... hoje não estou bem. Minha cabeça está doendo, parece que vai explodir.
Bem, quem sabe não seria melhor eu ir para casa descansar, talvez amanhã eu esteja me sentindo melhor para fazer meu trabalho.
Daqui eu posso ver o segurança que está do outro lado do banco, ele também está alerta para tudo. Será que ele também está tenso hoje? Isso eu não posso responder, mas posso notar que ele está com o semblante fechado, a cara séria.
O banco está bem cheio. E todas essas pessoas, podem, de repente, terem suas vidas entregues a minha mercê, onde eu serei o responsável por sua sorte, ou seu infortúnio. Mas eu não posso pensar nisso, se não, eu não irei conseguir realizar meu trabalho direito. Infelizmente, eu tenho que pensar, primeiramente, em mim mesmo, em minha família, e no trabalho que tenho que realizar, independente de tudo.
Na bem da verdade, eu não queria, ter que realizar esse tipo de trabalho. Na verdade mesmo, eu queria ser arquiteto; meu sonho era ser arquiteto, construir casas, lares de fraternidade e carinho, ninhos de felicidade e paixão. Mas a vida é assim mesmo, nos sufoca, e nos amarra os pés ao chão, sem ao menos nos dar chance de voar e sonhar. Temos que nos deparar com a triste realidade de não ter o que pôr na mesa de sua casa, de não ter o que pôr na boca de seus filhos. Então somos obrigados a fazer coisas que não gostaríamos, de realizar coisas das quais poderemos nos arrepender um dia.
E aqui estou eu, preparado para realizar meu trabalho, independente de outras tantas pessoas de outras tantas famílias que estão dentro deste banco, e que talvez estejam passando por necessidades quase tão grande quanto a minha. Mas que todos eles me perdoem se não penso na condição em que cada um está, pois eu vim aqui realizar meu trabalho, e irei fazê-lo de uma forma ou de outra.
É... olhe só aquela senhora idosa reclamando como o atendente do banco, ela está nervosa, gritando muito. A senhora começou a chorar, deve estar desesperada, não sei... Todos pararam para olhar a ela, e quem sabe, sentirem-se melhor com isso, constatando que aquela pobre mulher está passando por sofrimentos mais duros e mais pesados do que elas próprias, agradecendo assim por sua relativa desgraça.
É assim sempre. Sempre irão existir pessoas em melhores condições do que nós, mas também, sempre irão existir pessoas em piores condições do que a gente, para nos dar uma certa resignação na vida.
Acho que é chegado o momento de agir. Puxa, de repente, me deu um frio na espinha. Não sei, estou tendo um mal pressentimento, acho que o dia de hoje não vai terminar muito bem.
O segurança do outro lado do banco continua impávido, olhando com indiferença, para o desespero daquela senhora.
Então é minha hora de agir, agora que todas as atenções estão voltadas para aquela senhora, é só eu caminhar em direção ao segurança.
Até que enfim... enfim irei terminar logo com isso, chega de esperar, chega de angústia. Agora é tudo ou nada, daqui para frente, não há mais volta, é só eu dar meu brado de Independência ou Morte!
Infelizmente, é a necessidade que me move. Não há como viver em paz, quando a própria sociedade lhe rouba esta benesse.
O segurança não está notando minha aproximação, ele parece estar realmente num dia ruim, deve estar tenso também. É só eu puxar minha arma e rendê-lo.
– O que é isso?! – me disse o segurança, assim que viu minha arma apontada para ele.
– Me dê sua arma?! – eu disse.
– Minha arma?! – ele perguntou assustado.
– Sim sua arma! E me acompanhe até o caixa em silêncio.
Ele fez o que eu disse. As pessoas dentro do banco estavam tão ocupadas vendo a confusão que a senhora aprontava, ou então tão ocupadas com seus próprios problemas que nem notaram o que estava acontecendo.
Aproximei-me do caixa, junto ao segurança e disse ao rapaz do caixa, dando-lhe minha mochila:
– Esvazia sua caixa e ponha tudo dentro desta mochila! Isto é um assalto!
Ele olhou assustado para o segurança que eu mantinha refém. O segurança lhe respondeu afirmativamente com a cabeça. O caixa então, fez exatamente como eu disse, pegou todo o dinheiro e colocou dentro da mochila. E isso se repetiu, com outros dois caixas que atendiam.
Mas para azar meu, de repente, apareceu outro segurança de dentro do banco:
– Parado! Largue sua arma! Todo mundo no chão, protejam-se!
As pessoas entraram em desespero, gritaram, e choraram. E eu também me assustei com aquilo, não esperava por outro segurança. Ele ficou imóvel com a arma apontada para mim. Um desespero enorme começava a me dominar. Eu nunca tinha feito aquilo, e logo no primeiro assalto que me propus a realizar, as coisas começavam a dar errado.
O segurança armado estava resoluto, imóvel com a arma em punho. Mas em um minuto de sobriedade eu disse a ele que soltasse a arma senão eu atiraria no outro segurança que eu mantinha refém.
– Mas meu senhor eu sou um pai de família! Não faça isso comigo pelo amor de Deus! – disse-me, o meu refém.
O sangue me ferveu na cabeça, o que era aquilo que eu estava fazendo.
“Meu Deus, a que ponto cheguei?!”
Mas agora era tarde! “Independência ou Morte!”
– E eu também sou um pai de família meu amigo! – respondi a ele. – E é por isso que estou tomando uma atitude tão extrema!
– Mas pelo amor de Deus, pense em seus filhos, não faça isso!
– Eles não saem de minha cabeça, tenha certeza disso! E é por eles não ter o que comer que estou fazendo isso.
O segurança armado, se aproveitando de minha distração, havia se aproximado perigosamente, e num movimento de reflexo, desferi-lhe dois tiros. Um lhe atingiu na perna esquerda e outro na altura do abdômen.
A partir daí, o nervosismo e o desespero tomaram conta de mim por completo, e também de todos que estavam dentro do banco.
Berrei aos outros caixas que enchessem também a mochila com o dinheiro. Eles terminaram de encher a mochila tremendo e se borrando de medo. Peguei minha mochila e a joguei no ombro esquerdo.
Fui então, saindo lentamente, com o segurança ainda como meu refém. E como eu não tinha experiência nenhuma naquilo, nem tive o trabalho de pegar a arma do segurança em que eu atirei, erro do qual me arrependi profundamente.
Ele pegou a arma e ainda deitado no chão, disparou em minha direção. O tiro me acertou no braço esquerdo. Por sorte foi de raspão.
Enfurecido com aquilo, com o ódio em meus olhos despertado pela dor, disparei vários tiros na direção do segurança. Acertei mais uns dois tiros, e ele não resistiu.
Só que, segundos depois, uma coisa me chamou a atenção: um pouco mais atrás uma mulher chorava e esbravejava com uma menininha em seus braços toda ensangüentada. Eu havia atingido a ela com um tiro.
Aquilo me mortificou... me tirou da realidade...
Foi como se tudo sumisse a meu redor. Não havia mais banco, não havia mais segurança refém, não havia dinheiro, não havia mais nada.
Por um momento, aquela menininha, pareceu-me ser a minha própria filha. Corri para lhe acudir com os olhos cheios de lágrimas. Sua mãe me espancava, me chamando de assassino.
Passei minha mão, na testa daquela pobre menininha toda molhada de sangue, tremendo muito e totalmente arrependido por ter feito aquilo.
Só fui despertado daquele meu delírio, quando vários projéteis incandescentes chocaram-se em minhas costas, trazendo o gosto de ferrugem e fel a minha boca.
Virei-me e vi um homem a paisana, que provavelmente deveria ser um policial, com uma arma em punho, ainda apontada para mim.
Mas eu já não estava mais com a arma em minhas mãos; já não estava mais, com ar em meus pulmões; e o sangue, mal chegava a minha cabeça. Minha vista escureceu-se rapidamente...
... e aquela menininha parecia tanto com minha filha.