Delírios Musicais
Despertei por mais um dia
Dentro desta minha cela
Dormindo sobre a sujeira
Antes fosse chão de terra
Despertei por mais um dia
Neste recinto mal cheiroso
Ardem olhos e narinas
Ar tão pesado e tão viscoso.
Despertei por mais um dia
Os meus olhos quase cegos
O sol mal me alcança
Os seus raios mal enxergo.
Lamentei por mais um dia
Pelos prados que não vejo
Cerco de pedras e rancores
Neste mundo de cimento
Lamentei por mais um dia
Pelo caos em meus ouvidos
Entre choros e blasfêmias
Deste povo tão sofrido.
Despertei por mais um dia
Preso em minha cidade
Lamentei por mais um dia
Me roubaram a liberdade.
“Cercado por grades de prédios
Acorrentado pelas ruas
Amordaçado pelos carros
Fios elétricos de atadura
Roupas de fumaça
Muros de avenidas
Zoológico humano
Choros de buzinas”.
Há procissões de assaltantes
Novenas de políticos
Penitência de traficantes
E quaresmas de bandidos.
E ao o quê, se reza?
E ao quê, se preza?
“…O povo foge da ignorância
Apesar de viver tão perto dela
Sonham com melhores tempos idos
Contemplam sua vida numa cela”.
Sobre a música: Resultado de um momento de semi-consciência. Visão que tive ao despertar, ouvindo a música “Terra” de Caetano Veloso. Contém grandes e relevantes perguntas: Onde está, de fato, a prisão? Quem são, realmente, os detentos? E também, tem Zé Ramalho, sempre presente, trazendo inspiração, ligando idéias.