"Na Incoerência das Eras".
Político é tudo igual mesmo. Depois de aprontar um monte de tramóias, nas eleições daquele ano, o candidato tal, estava sofrendo de angústia e de ansiedade; estava com mania de perseguição. Na política de nosso país, pelo visto, tudo é válido mesmo: chamar o adversário de cachaceiro, dizer que a esposa do outra é uma vagabunda, que este está velho e gagá, que aquele é um bicheiro metido com tráfico, ameaças a familiares, brigas entre cabos eleitorais, e etecetera e tal.
E aquele candidato estava preocupado, vinha sofrendo muitas ameaças. Poxa, ele nem tinha gostado, quando certos correligionários seus, haviam pegado de pauladas, um cabo eleitoral adversário; nem gostava de arrecadar dinheiro para sua campanha, através de caminhos e de pessoas escusas. Agora, andava sempre com a pulga atrás da orelha. Estava pensando em contratar seguranças para lhe acompanhar, talvez ajudasse, talvez não. O clima estava pesado, e sua ansiedade era tanta, que tinha que tomar analgésicos para as constantes dores de cabeça, e antiácidos para lhe acalmar o estômago. Bem, pelo menos eles já haviam distribuído várias cestas básicas pelos bairros mais pobres da cidade, tudo atrás do voto fácil e sem compromisso do eleitor mais humilde. Nessas épocas de eleições, as caridades e favores multiplicam-se: é um tal de doar matérias de construção, cestas básicas, promessas de emprego, pagamentos de operações, tratamentos médicos diversos, enfim...
Durante aqueles dias, o partido do candidato A, principal adversário nas eleições, estava estudando uma aliança para com o partido do candidato B, ao qual pelo andar da carruagem, já não obtinha chance alguma de ser eleito. As pesquisas mostravam a vitória com folga de nosso candidato, mas ele temia que a aliança de seus adversários, pudesse mudar um pouco as coisas. Ainda mais, que corria a boca pequena, que este candidato B – que já não possuía chances de vencer – estava com uma ótima idéia de como fraudarem os votos nas urnas. Nosso candidato não podia deixar que o candidato B se unisse a seu principal concorrente. O seu partido teria que, de alguma forma, trazer este político para o seu lado. Outro fato que muito lhe preocupava durante aqueles dias, eram algumas acusações de que seu partido, ou alguns correligionários de seu partido, haviam assassinado um cabo eleitoral adversário. Os jornais locais, noticiavam tudo: o que diziam uns, o que diziam outros; muitos fingiam não saber de nada, muitos fingiam saber de tudo.
* * *
Nosso candidato voltava para sua casa, esgotado, era chegado o fim de mais um dia estressante. Retirou todo o material político que carregava no carro e levou tudo para o escritório, em sua residência. Parou por alguns segundos, sentou-se em sua cadeira para descansar, e tomar um pouco de fôlego. Não via a hora de tudo terminar, as campanhas políticas estavam lhe matando. De repente, seus olhos pousaram sobre um objeto estranho: viu em cima de sua mesa, uma arma. Estranhou de imediato. Aquela arma não era sua, e ninguém em sua casa possuía arma. A primeira coisa que lhe veio a mente, foram as acusações de que pessoas de seu partido teriam assassinado um adversário político. Sentiu um calafrio subir-lhe pela coluna. Aquilo só poderia ser uma armação; estavam tentando forjar alguma para ele. Não pensou duas vezes; esqueceu-se de sua canseira, de seu abatimento, e tratou logo de dar um fim naquela arma. Era uma pistola, e ainda estava no seu coldre. Nosso candidato colocou a arma no bolso interno do casaco e foi até seu carro, decidido a sair. Rodou com o carro pelas redondezas, e assim que passou perto de um pequeno rio, parou o carro. Desceu como quem não queria nada, olhou discretamente para os lado e como não viu ninguém, retirou a arma do bolso e lançou dentro d’água. Voltou veloz para seu carro e rumou de volta para casa. Estava suando e todo trêmulo. Quem bom que faltava pouco para o dia da eleição, senão, ele acabaria tendo um colapso, um enfarto, ou talvez até, um derrame. Naquela noite ele não conseguiu dormir direito.
Para sua felicidade, o dia das eleições chegaram logo. Seus adversários não haviam feito a aliança, tudo parecia correr muito bem. No entanto, política é política. Terminado de contar os votos, para surpresa de nosso candidato, e de todos de seu partido, seu principal adversário havia vencido as eleições, e com uma boa margem de votos. Exigiram a recontagem dos votos, o que foi feito; e que também, acabou confirmando a vitória de seu adversário. Todos do partido de nosso candidato, inclusive ele, saíram com a certeza de que a eleição fora fraudada.
E reza a lenda, de que fora exatamente assim que ocorrera; de que o candidato B, aquele que já não tinha chances de vencer, havia demonstrado com poderia ser fraudados os votos, e automaticamente, aquela eleição. Mas o partido do candidato A, acabaram não concordando com a aliança, mas trataram de executar por conta própria, a fraude sugerida pelo candidato B. Resultado: o candidato A, vencera a eleição.
Político é tudo igual mesmo...